Não há testemunhas, só testemunhos
São muitos os exemplos de tradições
machistas e patriarcais que aparecem nos livros da Bíblia, tanto na língua e
nos costumes, como nas leis e no conteúdo da teologia. Um exemplo curioso é o
que lemos no livro do Génesis (24,1-4), quando Abraão diz a um dos seus servos:
"Põe a tua mão debaixo da minha coxa e jura por Yahvéh, o Deus do Céu e da
Terra…" assim fazia Abraão os juramentos e todos os patriarcas da Bíblia.
Mas o "coxa" é um eufemismo: onde os homens que eram empossados
punham a mão era nos testículos. Agarrando os testículos de outro o compromisso
ficava selado.
Também durante o império romano os
homens estavam acostumados a levar a mão direita aos seus órgãos genitais,
símbolo de masculinidade, virilidade e coragem, quando faziam uma promessa ou
estabeleciam um contrato. Os orgãos produtores de sémen davam credibilidade à
palavra empenhada.
Esta prática, entre muitas outras,
reflecte a discriminação contra as mulheres: como elas não têm testículos, não
podiam testemunhar, não podiam dar testemunho nem herdar em testamento.
Na terra de Jesus, a mulher não
contava para nada nos tribunais. Da cultura judaica à língua portuguesa, todas
estas palavras - "testemunho", "testemunha”, testamento" -
têm a mesma raiz (testículos) e provêm da mesma cultura patriarcal. Ainda hoje,
nos melhores dicionários, não existe a palavra "testemunha" como que
insinuando que uma mulher não o pode ser, que a sua palavra não vale nada, que
seus juramentos são sempre questionáveis.
Durante séculos e em todos os países,
as mulheres não tiveram direito à propriedade ou herança, não assinavam, não
decidiam, não elegiam, não votavam. Tudo isto mudou, mas não sem grande
esforço, luta, sofrimento e sangue.