Igrejas
do Pão e Circo
É o
preço deste tempo: o que entra na rede, se multiplica em velocidade
exponencial. Assim como os devaneios das “Igrejas Pão e Circo”, que se
multiplicam em velocidade alarmante.
Creio que você já deve ter ouvido alguma vez a expressão
“Pão e Circo” em sua vida, correto?
Vou
contar brevemente o motivo de tal expressão. Nos dias da Roma antiga
praticava-se a política “panem
et circenses” (política do pão e circo), já que devido a fatores
socioeconômicos, houve um considerável êxodo dos moradores das regiões rurais
em direção a Roma. Sem emprego e sem ter o que comer, a multidão se tornava um
perigo crescente para ordem social, levando o império a tomar uma decisão
que entorpeceria o povo, fazendo-os esquecer da realidade e
maquiando a verdade onde estavam inseridos. Manobra de manipulação em massa.
Tudo
muito simples: de modo constante ocorriam lutas envolvendo gladiadores nos
estádios, sendo o Coliseu o mais conhecido de todos. Durante as lutas o povo
era “gentilmente” alimentado. Enquanto se divertiam com o show de horrores e se
alimentavam de modo precário, a multidão ficava “domada”. Mesmo estando mal
alimentado e podendo curtir um entretenimento raso, o povo se contentava e não
haveria preocupações relacionadas à massa para que os poderosos viessem a ter
incômodos.
Vindo
para nossa proposta, temos como fato que nossos dias têm sido marcados por
agito eclesiástico. Onde olhamos é possível constatar gente que anda “em
roda por todo o vento de doutrina, pelo engano dos homens que com astúcia
enganam fraudulosamente” (Ef 4.14).
Vi
recentemente coisas que – infelizmente – não chocam mais. Ilustrações trágicas
travestidas de mensagem do Evangelho, mas que são vazias do mesmo. “Pastores”
utilizando poço e lama para ilustrar e infectar seus seguidores com a nefasta
Teologia da Prosperidade e similares; outros da ala dos “revoltados” com a vida
utilizando crianças para expor suas teorias mercantilistas mirabolantes; igreja
emprestando o altar para que o sósia de um apresentador faça micagens; a
infestação da Teologia Relacional (Teísmo Aberto), com seus “pensadores”
liberais e moderninhos, e por aí vai. A lista é grande, e você sabe bem disso,
não é preciso repetir.
De modo
claro e direto, tais demonstrações nada mais são que “pão e circo”. Todo mundo
se diverte com o show de horrores com jeitinho de Evangelho, “come” um pãozinho
aqui e acolá, volta para sua casa e se engana achando que está alimentado com
pão genuíno. Seja sincero: você acredita que tais práticas correspondem ao
Evangelho e a missão da Igreja no mundo? Se você acha que sim, peço que calque
biblicamente sua resposta, já que as Escrituras quase não são utilizadas
nos Coliseus
eclesiásticos, e quando são, é de modo pervertido e desconexo.
Mas não
vamos gastar mais linhas falando sobre o problema. A proposta é falar mais
sobre o que acredito – biblicamente – ser um caminho de solução. Lendo muito
sobre o assunto, vendo a prática de muitos pastores e professores, de pessoas
não presas a métodos e a números, mas sim enveredadas na senda da qualidade
eclesiástica.
O que
fazer para melhorar um pouco este cenário?
Fato é
que os líderes que apregoam o “Pão e Circo” dificilmente mudarão a sua práxis.
O foco deste texto é tentar alcançar aqueles que estão seduzidos pelo erro e
vacinar os que não têm contato com as modinhas, bem como reforçar e incentivar
os cristãos a permanecerem na Verdade.
COISAS SIMPLES E FUNCIONAIS
Exposição bíblica / pregação
expositiva: Você já teve a oportunidade de receber
alimento sólido através de uma exposição bíblica?
Os
púlpitos estão cada vez mais carentes da exposição da Verdade. É chocante ver
que dia-a-dia nossos pastores estão se transformando em animadores de plateia e
terapeutas se distanciando da genuína vocação. Nesta via de mão dupla, a
plateia anseia pelo espetáculo e quer a todo custo ouvir o que agrada, enquanto
aquele que deveria expor a Verdade a todo custo, acaba cedendo a vontade dos
seguidores.
Se uma
mãe alimenta o filho apenas de batata frita, por mais que o filho ame tal
comida, o deixará doente, desnutrido e obeso. E a analogia bate com a saúde do
povo evangélico. Um povo carente de alimento sólido e obeso de teorias e
filosofias humanas de sucesso e prosperidade.
Mark
Dever é um pastor que pensa assim. Veja sua opinião:
Se alguém me procura e pergunta se deveria aceitar o pastorado
de uma igreja que não deseja que ele pregue de maneira expositiva, talvez eu o
desestimulasse a aceitar essa posição. Se um cristão me procura e diz que um
falso evangelho é ensinado consistentemente no púlpito de sua igreja,
provavelmente eu o encorajaria a mudar de igreja.
Por que digo isso com tanta firmeza? Pela mesma razão que
desestimularia alguém de ir a um restaurante onde não servem alimentos, mas
somente figuras de alimentos. A Palavra de Deus, somente a Palavra de Deus, dá
vida! [1]
De fato,
existem métodos variados de pregação: pregação em tópicos, pregação biográfica,
pregação histórica, etc. Porém a pregação expositiva é a que provem o sólido
alimento pelo fato de expor a Palavra de Deus. Expor as Escrituras
demonstra submissão total ao Deus da Palavra. Como é maravilho mergulhar num
determinado texto, absorver seu conteúdo contextual e poder absorver o ensino e
aplicar na própria vida! Não há preço que pague tamanha refeição.
Minha
esperança é que o pastor que leia este ensaio se desperte para a pregação
expositiva. Desta forma a autoridade da pregação sempre começa e termina na
Escritura. Sempre! Não
devemos nos enganar, igrejas cujo eixo não é a Palavra (existem igrejas onde o
louvor é o centro do culto, ledo engano) tendem a superficialidade. Antes que
os “levitas” [2]
me apedrejem, reafirmo a necessidade do louvor, porém a Palavra de Deus é o foco
do culto. A igreja não deve estar edificada sobre a música, mas sobre a
Palavra.
E vou
além: nossas canções precisam de base bíblica profunda. É duro constatar um
sermão profundamente bíblico e expositivo, porém regado a canções centradas no
homem para que ele se sinta bem, prosperando “para direita, para esquerda” e por aí vai.
Bíblia, maravilhosa Bíblia
A
teologia bíblica é o norte que nos garante o caminho certo. Quando se desvirtua
a centralidade da Palavra, tende-se a migrar para caminhos ermos. Tende-se a
correr atrás de um horizonte
utópico, como certo pensador falou
acerca de algo profundamente bíblico e absolutamente verdadeiro.
Em
nossos dias, onde a pseudoteologia dos neopensadores tenta a
todo custo derrubar a teologia, falar em sã doutrina é visto como insanidade,
intolerância, pensamento na caixinha.
Quero
incentivar o leitor a ir um pouco além. O cristão de nossos dias não se sente
motivado a estudar sobre doutrinas centrais da fé cristã. O ambiente é tão
hostil, tão modificado, que soa estranho (e sinceramente, as vezes me sinto um
dinossauro) quando incentivo alunos e leitores ao estudo sistemático das
Escrituras e ao estudo – ao menos superficial – de matérias teológicas.
Aquilo
que até pouco tempo atrás era fundamental e verdadeiro, foi travestido de
pensamento bitolado pelos dirigentes dos Coliseus eclesiásticos. E viva a farra
do “pão e circo”.
A Bíblia
é incisiva ao alertar que o ensino correto deve ser aplicado na igreja. Não fui
eu que inventei isso, mas é alerta da Palavra. Tomemos por exemplo a exaustiva
insistência de Paulo para Timóteo e Tito (leia as cartas, são curtas e
profundas). A insistência de Paulo na questão doutrinária é impressionante, um
verdadeiro megafone para a igreja de hoje.
A
pregação expositiva, em aliança com a teologia bíblica, fará toda a diferença.
Deixo as palavras sábias de um mestre nas Escrituras, Lawrence Richards, que de
certo modo é uma bela aplicação sobre tudo que foi dito até aqui:
1) Conhecer a verdade , estar comprometido com a sã doutrina,
precisa nos levar à santidade de vida, ao autocontrole, à reverência etc.; 2)
Não se espera somente que a verdade tenha um grande impacto sobre a nossa vida,
mas que a vida esteja em harmonia com a verdade. Nossas boas obras precisam
refletir nossas crenças; 3) É a verdade que produz o estilo de vida marcado
pela santidade, e não o contrário. Ser uma “boa pessoa” não leva o indivíduo à
verdade. Mas ela, aceita e aplicada, produz a santidade em nós. [3]
Não seja
apenas um “revoltado com o sistema”. Precisamos ser mais práticos neste momento
e tentar melhorar o quadro, ao menos com alertas na neblina. É nosso dever.
Oremos
pela igreja para que os pastores se voltem para as Escrituras e para que nossos
irmãos em Cristo busquem esse compromisso. Ainda há esperança.
Pão e
circo, não. Pão da vida, sim (Jo 6.35).
João Rodrigo Veronka
.
NOTAS
[1]
DEVER, Mark. O que é uma igreja saudável? São José dos Campos: Editora Fiel,
2009. p.56
[2]
“Levitas” estão em aspas, pois, biblicamente falando, em nossos dias, o ofício
levítico simplesmente não existe. Os que usam o título para si o fazem por
ignorância ou propositalmente. A pregação expositiva é um remédio para tratar
tamanho equívoco.
[3]
RICHARDS, Lawrence. Comentário bíblico do professor. São Paulo: Editora Vida,
2004. p. 1124-25
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