O texto de 1Pedro 3: 18-20 tem sido motivo
de muitos debates entre teólogos
e cristãos. Mas, será que Cristo desceu
a um mundo inferior entre
a sua morte e ressurreição?
É o que vamos analisar.
de muitos debates entre teólogos
e cristãos. Mas, será que Cristo desceu
a um mundo inferior entre
a sua morte e ressurreição?
É o que vamos analisar.
As várias interpretações
1) Interpretação arminiana - Defende
que os contemporâneos de Noé não tiveram nenhum redentor e nenhum guia.
Portanto, Deus teve de lhes suprir esta deficiência e, assim, por fim, o Senhor
ressuscitado lhes trouxe a salvação. Para eles, a rejeição do Evangelho no passado
não foi uma rejeição final e definitiva.
Mas, será que a morte não
coloca um fim no período em que Deus opera com Sua graça para salvar pecadores?
Será que existe neste texto de Pedro o ensino de uma nova oportunidade para os
ímpios se salvarem, mesmo depois de sua morte? A grande dificuldade é que os
santos do Antigo Testamento já haviam crido no Messias e, por isso, estavam
justificados, Rm 4: 3; Gl 3: 6-9.
2) Interpretação luterana diz que
Cristo morreu e, antes de ser ressuscitado, teve seu espírito restituído ao
corpo e, na totalidade de sua natureza humana, foi ao inferno e proclamou sua
vitória a Satanás. Mas, essa interpretação traz dificuldade porque não havia
tido ainda nenhuma manifestação de vitória de Cristo.
3) Interpretação anglicana ensina que
a alma de Cristo desceu ao inferno para conquistar a morte e o diabo (tomar as
chaves) e para libertar as almas dos homens justos e bons, que desde a queda de
Adão morreram por causa de Deus e na fé e na crença em Jesus, que estava para
vir. Sua conquista destruiu qualquer reivindicação que o diabo tinha sobre os
homens, e a descida foi parte do "resgate" pago por Cristo.
Mas, as Escrituras não ensinam
que os crentes do Antigo Testamento foram para o Hades e que Jesus lá desceu
para libertá-los. Esses crentes foram estar com Deus após a sua morte, Sl 73:
23-24. Enquanto Cristo estava na terra, Elias e Moisés já estavam com Deus no
céu, e não no Hades, 2Rs 2: 11; Lc 9: 29-32.
Jesus Desceu ao Inferno?
I Pe 3.19 - Jesus desceu ao inferno? (Parte 1) / Daniel
Grubba
A Bíblia, como qualquer outro livro da antiguidade, contem
algumas passagens que são de difícil interpretação. E mesmo com tanto
progresso exegético e hermenêutico, ainda assim, em alguns casos específicos,
a busca pelo real significado do texto é uma tarefa árdua. Todavia, a
complexidade da tarefa não nos impede de tentarmos transpor estes abismos,
seja ele cultural, histórico, religioso, teológico, filosófico ou
lingüístico, uma vez que a teologia exegética tem desenvolvido, em contato
com outros ramos do saber, algumas ferramentas fundamentais, que certamente
nos ajudará a transpor os abismos.
Dos muitos textos bíblicos que tiram o sono dos teólogos,
existe um que simboliza toda esta questão. O texto é I Pedro. 3.17-20. Assim
está registrado:
Porque melhor é sofrerdes fazendo o bem, se a vontade de Deus
assim o quer, do que fazendo o mal. Porque também Cristo morreu uma só vez
pelos pecados, o justo pelos injustos, para levar-nos a Deus; sendo, na
verdade, morto na carne, mas vivificado no espírito; no qual também foi, e
pregou aos espíritos em prisão; os quais noutro tempo foram rebeldes, quando
a longanimidade de Deus esperava, nos dias de Noé, enquanto se preparava a
arca; na qual poucas, isto é, oito almas se salvaram através da água.
Destes três versículos, há um que chama atenção de qualquer
leitor atencioso. No verso 19, o autor, está afirmando categoricamente que
Jesus pregou aos espíritos em prisão. Mas que raio de espíritos são esses?
Quando e onde exatamente Jesus pregou a estes espíritos? Porventura, são
estes espíritos, espíritos dos mortos santos? Ou pecadores? Ou são espíritos
malignos? Como vemos, muitas questões vem à tona, porque o texto não é claro
em respondê-las. Mas este texto suscita uma outra outra pergunta, que pode
ser considerada como a “pergunta que não quer calar”. Jesus desceu ao inferno
para pregar aos espíritos? Obviamente, esta pergunta ainda tem
destroncamentos. Existem outros textos bíblicos que apóiam esta
interpretação? Qual a razão de Jesus ter ido pregar aos espíritos no inferno?
Este é o tipo de texto em que devemos tomar muito cuidado,
justamente por causa da sua falta de clareza. Uma das regras da hermenêutica
bíblica, desenvolvida por Agostinho (354-430 d.C.), serve muito bem de alerta
contra a tentação de apoiar uma doutrina em um versículo enigmático. A nona
regra de Agostinho, conforme resumo de Ramm, preza que “se um significado de
um texto é obscuro, nada na passagem pode constituir-se matéria de fé
ortodoxa” [1].
Esta regra é tão bem fundamentada que nunca foi descartada e ainda esta em
voga. Norman Geisler, renomado teólogo da atualidade, afirma que é um grande
erro “basear um ensino numa passagem obscura”[2].
A primeira proposta que deve ser descarta como herética, é a
idéia equivocada de que Jesus foi ao inferno para dar uma segunda
oportunidade aos incrédulos que morreram em iniqüidade. Mas alguém crê nisso
realmente? Sim. Este é o caso dos universalistas[3],
mas principalmente dos mórmons, que acreditam baseado neste versículo que as
pessoas têm uma segunda chance de serem salvas após a morte, afinal, um Deus
realmente amoroso deve ser capaz de oferecer uma outra oportunidade as
pessoas no sentido delas poderem mudar de decisão.
Primeiramente, esta idéia pressupõe que Deus não deu
oportunidades as pessoas antes de elas morrerem, ou que simplesmente não
houve tempo suficiente para o indivíduo tomar uma decisão, e isto se trata
evidentemente, de uma especulação sem nenhum fundamento. Em segundo, a bíblia
não dá suporte a esta idéia. O texto de II Pe 3.9 declara que Deus esta
aguardando, mediante sua longaminidade, o arrependimento dos homens, e isto
quer dizer que ninguém pode alegar falta de tempo. Um outro testemunho
bíblico bastante incisivo, que refuta esta idéia de que não houve
oportunidades antes da morte, foi elaborado pelo apóstolo Paulo em Rm. 1.20,
que diz que a verdade de Deus esta claramente revelada através da obra de sua
criação, portanto todos são indesculpáveis. E para aumentar ainda mais a
responsabilidade do homem em relação às imutáveis leis de Deus, Paulo
enfatiza, mas também amplia a idéia de Rm 1.20 em Rm 2.15, declarando que
Deus colocou sua lei moral na consciência de todos os homens, tanto judeus,
que tinham a lei escrita, quanto gentios, que não a tinham. Segue-se ainda o
fato da bíblia, sem qualquer chance de interpretação dúbia, declarar “que aos
homens está destinado morrer uma só vez e depois vem o juízo” (Hb 9.27, ver
também Lc.16.26).
J.P. Moreland, filósofo e teólogo cristão, reforça o
testemunho bíblico acrescentando um argumento filosófico bastante
interessante. Ele diz que “se as pessoas vissem o trono do julgamento de Deus
após a morte, isto seria tão coercitivo que não mais teriam a possibilidade
da livre escolha e qualquer decisão que tomassem não seria uma livre escolha
real e genuína, mas totalmente forçada, uma vez que estariam fazendo uma
escolha prudente só para evitar o juízo[4]”. Ainda no aspecto
ético-filosófico, Wayne Grudem nos lembra que Pedro não diz que Jesus pregou
aos espíritos em geral, mas só aos que “noutro tempo foram desobedientes
[...] enquanto se prepara a arca[5]”. E se Cristo ofereceu uma
segunda oportunidade de salvação, porque só a esses pecadores da época de Noé
e não a todos[6]?
[1] - Citado
por Henry Virkler em Hermenêutica Avançada, p. 45.
[2] - Norman
Geisler enumera em seu livro Manual Popular de Dúvidas, Enigmas e
contradições da Bíblia, os principais erros de categoria cometidos pelos críticos
da Bíblia. Abordamos a número 6 que diz: basear um ensino em uma passagem
obscura. Lista completa, p.18-32.
[3] - Sistema
teológico e filosófico que afirma (baseado mais na intuição humano do que na
doutrina bíblica), que todos os homens serão salvos. Na pior das hipóteses o
inferno que existe é apenas um período passageiro, uma espécie de purgatório.
Mais detalhes em Enciclopédia de apologética (Norman Geisler). p.847-852
[4] - Citado no
livro de Lee Strobel, Em defesa da fé, p.256.
[5] - Isto fala
de um publico bastante limitado (I Pe. 3.20) – rebeldes [...] da época de
Noé. Portanto qualquer teoria que se baseie em I Ped. 3.19 deve levar em alta
consideração este contexto maior, que declara de maneira muito clara que
Jesus pregou aos “espíritos em prisão” que se rebelaram enquanto se preparava
a arca. Perceba que o texto não indicou o que vem a ser estes “espíritos em
prisão”.
[6] - Conforme
argumentação de Wayne Grudem em Teologia Sistemática, p. 492.
I Pe 3.19 - Jesus desceu ao inferno? (Parte 2) / Daniel
Grubba
Segunda teoria: Libertar os santos piedosos do AT
Para o teólogo escocês e judeu, Myer Pearlman, a passagem de I
Pe 3.19 testifica que Jesus desceu ao inferno em algum momento entre sua
morte e ressurreição. Mas Jesus desceu ao inferno para fazer o que
exatamente?
Em primeiro lugar, Pearlman credita esta passagem como um
cumprimento de profecias, ou seja, Jesus estava apenas cumprindo profecias do
AT (Salmo 16.10 e 49.15). Em segundo, Pearlman, afirma que Jesus após sua
morte, desceu ao coração da terra (Mt 12.40; Lc 23.42,43) para libertar os
santos do Antigo Testamento, levando-os consigo para o paraíso celestial. Ele
mesmo explica dizendo que “essa descrição parece indicar que houve uma
mudança nesse mundo dos espíritos e que o lugar ocupado pelos justos que
aguardam a ressurreição foi traslado para as regiões celestiais[1]”.
A implicação obvia de acordo com esta proposta de Pearlman é
que “desde este acontecimento os espíritos dos justos sobem para o céu [2]”.
Bom, se os espíritos dos santos do AT subiram para o céu a partir deste
momento especial, a conclusão lógica, é que antes de Cristo, os fieis iam
para o inferno e que estavam presos por lá até Cristo chegar. Mas onde
exatamente, encontramos na bíblia idéia de que os santos do AT foram para o
inferno após a morte [3]?
Vejamos algumas considerações:
Em primeiro lugar, devemos lembrar que o contexto maior de
Pedro, não especifica crentes no Antigo Testamento em geral, mas só os que
foram desobedientes “nos dias de Noé, enquanto se preparava a arca (I Pe
3.20). Em segundo lugar, o texto não diz que Cristo pregou aos que eram
crentes ou fieis a Deus, mas os que “noutro tempo foram desobedientes” – a
ênfase está na desobediência deles [4].
Em terceiro, o “seio de Abraão” (Lc. 16.23), provavelmente não é uma
descrição do inferno e sim do céu, uma vez que o lugar para onde Abraão foi é
chamado por Jesus de reino dos céus (Mt. 8.11). Em quarto, a Bíblia registra
em muitas passagens que a alma dos santos do AT após morrerem vão diretamente
para o céu [5],
porque seus pecados foram perdoados pela confiança no Messias que viria (Gn
5.24; 2Sm 12.23; Sl 16.11; 17.15; 23.6; Ec. 12.7; Mt 22.32-32; Lc 16.22; Rm
4.1-8; Hb 11.5).
Ainda que esta posição seja melhor que a primeira (segunda
chance para os penitentes), e a também a mais popular [6],
estas considerações enumeradas acima, mostram muitos pontos fracos, o que nos
leva desconsiderá-la como uma interpretação válida.
[1] - Myer
Pearlman, Conhecendo as doutrina da Bíblia, p. 375.
[2] - Idem, p.
375.
[3] - De acordo
com os partidários desta posição havia dois compartimentos no inferno, uma
para os salvos e outro para os perdidos. Esta proposta esta baseada
principalmente em Lc. 16.19-31 que fala sobre o local dos mortos (em hb.
Sheol e gg. Hades, ambos vocábulos significam sepultura). A parábola do Rico
e Lazaro fala que os dois morreram. O primeiro foi para o Inferno e o segundo
para o Seio de Abraão. Myer Pearlman conclui a partir daí que havia duas
divisões no Sheol, um lugar de sofrimento e outro lugar de descanso. Até
mesmo a morada dos santos mortos, não era o céu propriamente dito, mas estava
situado nas regiões inferiores.
[4] - Wayne
Grudem, Teologia Sistemática, p. 493.
[5] - De uma
maneira curiosa Myer Pearlman confirma esta idéia, o que obviamente contradiz
o que ele quer comprovar. Myer afirma que “havia pessoas verdadeiramente
justificadas antes da obra expiatória de Cristo” - (Abraão – Rm.4.23; Moises
– Lc.9.30-31; Enoque e Elias ambos arrebatados para o céu). – Myer Pearlman,
Conhecendo as doutrinas da Bíblia, p. 197.
[6] - O pastor
e apologista da doutrina pentecostal, Marco Feliciano, considerado como “o
pregador do povo”, popularizou esta posição em sua pregação intitulada “A
agonia da cruz”, pregado na Igreja Assembléia de Deus (dez/2004). De uma
maneira bastante eloqüente e poética, o pregador leva o público a meditar no
momento em que Cristo desceu ao inferno e quebrou as cadeias dos santos do AT
que estavam aprisionados.
I Pe 3.19 - Jesus desceu ao inferno? (Parte 3) / Daniel
Grubba
Terceira teoria: Proclamar vitória aos poderes das
trevas
Uma terceira posição, é a de que Jesus, entre sua morte e
ressurreição foi a inferno. Porém, a diferença é que esta suposta viagem
metafísica não foi planejada com a intenção de oferecer segunda chance aos
penitentes, tampouco libertar santos do AT, mas apenas para proclamar uma
mensagem de vitória aos poderes do maligno. Esta teoria é tão popular quanto
a anterior (libertar santos do AT).
Para Norman Geisler e Ron Rhodes, os espíritos em prisão “eram
seres não salvos, devem ter sido anjos ao invés de seres humanos [1]”.
Robert H. Gundry (Ph.D. em Estudos do Novo Testamento pela Manchester
University) diz que “a pregação de Cristo aos espíritos em prisão mui
provavelmente significa que Cristo desceu seu espírito ao hades, a fim de
proclamar Seu triunfo sobre os espíritos demoníacos que ali haviam sido
acorrentados por Deus [2]”.
Roger Stronstad, editor do Comentário Bíblico Pentecostal, afirma que Jesus
em virtude de sua morte, foi até os anjos aprisionados e anunciou sua vitória
sobre a morte e as conseqüências de seu triunfo, isto é de que julgamento já
estava selado [3].
Esta posição está fundamentalmente baseada em uma análise
léxico-sintática de I Pe 3.19. Como já vimos este versículo diz que Cristo
“foi e pregou aos espíritos em prisão” (NVI). E o que chama a atenção dos
estudiosos desta sentença é o verbo pregar. A análise revela que Pedro usa
propositalmente a expressão original grega kerussõ (khru,sow) que significa:
“ser arauto”, ou em geral, “proclamar” [4].
Este termo é diferente de outra expressão grega euangelizõ (euvaggeli,zw),
que significa pregar ou evangelizar (no sentido de dar oportunidade de
escolha), que quase sempre é usado acerca das “boas novas” relativas ao Filho
de Deus, conforme são proclamadas no Evangelho [5].
Neste contexto a melhor tradução bíblica em português de I Pe
3.19 é a KJA [6] que diz: “no qual igualmente foi e
proclamou aos espíritos em prisão”.
Tomar as chaves da morte, inferno e Satanás.
É muito comum ouvirmos em pregações, principalmente quando o
tema é batalha espiritual, uma expressão que diz: “Satanás é tão pobre que
nem a chave de sua casa (inferno) ele tem mais”. Esta expressão popular[7] está intimamente associada com a
idéia da ida de Cristo ao inferno. Muitos entendem que Jesus em sua rápida
passagem pelo inferno proclamou a vitória da redenção, e de quebra tomou das
mãos de Satanás as chaves do inferno e da morte.
Devemos mais uma vez rejeitar esta posição alegórica, pois o
texto de I Pe 3.19 não diz isto claramente. E os versículos que tratam das
chaves da morte e do inferno, nenhum, absolutamente, associa estas chaves
como pertencentes a Satanás. “Somente o Senhor possui as chaves da morte e do
inferno. Ninguém mais!”[8] Esta soberania está explicita em
textos como Mt. 16.19, que diz que a chaves do reino dos céus foi entregue
por Jesus aos apóstolos. E também em Ap. 1.18, texto em que o próprio Jesus
declara que as chaves da morte e do hades (NVI) pertencem a ele. Em nenhum
momento Jesus diz foi ao inferno (ou até mesmo a bíblia), e precisou roubar
as chaves das mãos de Satanás, uma vez que este ser angelical nunca as teve
em suas mãos [9].
Proclamar vitória aos anjos caídos
Segundo os expoentes desta teoria, a pregação aos espíritos, não
é às “boas novas” propriamente dita, mas o ato de Jesus proclamar Sua vitória
aos espíritos dos anjos caídos [10].
Com isso, eles querem dizer, que os “espíritos em prisão que há muito
desobedeceram [...] enquanto a arca era construída” (NVI) são os filhos de
Deus de Gn.6.2. Declara-se que os “filhos de Deus” eram anjos caídos, assim
como em Jó 1.6 e 2.1 que (segundo se declara) abandonaram seu estado
propriamente dito (espiritual) e se casaram com mulheres nos tempos de Noé [11] (Gn 6.1-4). Portanto, sugerem que
Cristo foi proclamar vitória a estes anjos caídos da época de Noé [12].
Sobre isto devemos dizer esta idéia está mais baseada em mitos
da literatura apócrifa apocalíptica judaica[13] do que na Bíblia, pois em Mt 22.30,
Jesus diz que anjos não se casam. Um outro ponto fraco desta interpretação é
que o contexto maior de I Pe 3 destaca pessoas hostis (I Pe 3.14,16) e não
demônios, ou anjos caídos. E mesmo que o texto indicasse que eram demônios,
exatamente de onde os leitores de Pedro encontrariam a idéia de que os anjos
pecaram “enquanto se preparava a arca (I Pe 3.20)? Não há nada disso na
história a respeito da construção da arca em Gênesis [14].
De fato, como acabamos de ver, estas interpretações propostas
são bem interessantes, mas algumas contradições irreparáveis as prejudicam.
Wayne Grudem após analisar esta tese (proclamar vitória aos poderes das
trevas) conclui:
Os leitores de Pedro teriam de se submeter a um processo de
raciocínio incrivelmente complicado para chegar a essa conclusão, já que
Pedro não ensina isso de modo explicito. [15]
[1] - Norman
Geisler e Ron Rhodes, Resposta às seitas, p. 411.
[2] - Robert H.
Gundry, Panorama do Novo Testamento, p. 394.
[3] - Roger
Stronstad comentando I Pe 3.19 no Comentário Bíblico Pentecostal, p. 1718.
[4] - De acordo
com o Dicionário VINE, p. 891. Ele diz que o verbo ekeryxen significa;
proclamar uma mensagem, da parte de um rei ou potentado. (Ver também; Gleason
Archer, em Enciclopédia de temas bíblicos, p. 356).
[5] -
Dicionário VINE, p.891.
[6] - A nota
textual de rodapé da KJA (King James Atualizada) explica que este tipo de
pregação foi uma proclamação vitoriosa realizada por Jesus sobre o inimigo e
toda a malignidade do universo (2 Pe 2.4-5; Cl 2.15).
[7] - O grupo
musical de louvor, Diante do trono ajudou a popularizar esta posição através
da música “A vitória da Cruz”, composta por Ana Paula Valadão Bessa e gravada
ao vivo no Parque da Gameleira (BH) em Jul/2000. A estrofe mais significativa
para nosso trabalho diz: “O Leão de Judá pisou bem forte e os esmagou, Tomou
as chaves das mãos do diabo, Abriu minas cadeias e me resgatou”. De fato é
uma linda poesia inspirada, resta-nos saber se é biblicamente correta.
[8] - Franklin
Ferreira & Alan Myatt, Teologia Sistemática, uma analise histórica, bíblica
e apologética para o contexto atual, p. 620. Citação tirada pelos autores do
livro de Heber Carlos de Campos, “Descenti ad Inferna”, p.126-127.
[9] - É
importante observar que o conceito de chaves em Ap. 1.18 está associado ao
controle absoluto de Deus sobre a vida e sobre a morte. Outros textos
corroboram com intensidade este conceito (Dt. 32.39; I Sm 2.6; Jo 5.21).
[10] -
Dicionário VINE, p. 892.
[11] - Outras
explicações menos lendárias devem ser analisadas e preferidas. Em outros
contextos “filhos de Deus” muitas vezes se referem a seres humanos, embora em
contextos diferentes (Dt. 14.1; 32.5; Sl 73.15; Is 43.6; Lc 3.38; IJo 3.1).
Uma possibilidade válida é que “filhos de Deus” se refere a homens piedosos,
descendentes de Sete e “filhas dos homens” se refere a mulheres pecaminosas
da linhagem ímpia de Caim. Mais detalhes em Nota Textual de Gn 6.2, da Bíblia
de Estudo NVI, p. 15.
[12] - É assim
que interpreta o texto David H. Stern. Ele diz: Os espíritos aprisionados são
os anjos que pecaram (2 ped 2:4) e não mantiveram sua autoridade originaria
(judas 6). Isto é, eles são “filhos de Deus ou filhos dos anjos), também
chamados nefilim (caídos), que caíram de sua própria esfera, o céu para a
terra, e “vendo (...) que as filhas dos homens eram formosas, tomaram para si
mulheres” nos dias de Noach (Gênesis 6:2-4). Mais detalhes em Comentário
Judaico do Novo Testamento, p. 820-821.
[13] - O livro
apócrifo de I Enoque ( datado de 165 a.C. a 90 d.C.) defende a idéia mostra
como os anos caídos coabitaram com as filhas dos homens que geraram uma raça
monstruosa de gigantes (I Enoque 7.1;15.1;86.1). Segundos o relato (15.1),
esses gigantes forma destruídos pelo Dilúvio, mas seus epíritos foram
deixados soltos como demônios para corromper todo gênero humano. (David, S.
Russel, Entre o AT e o NT, p.103.).
[14] - Wayne
Grudem, Teologia Sistemática, p. 493.
[15] - Idem, p.
493.
Jesus realmente desceu ao inferno?
Colocamos em pauta as três principais soluções apresentadas pelos estudiosos para o problemático texto de I Pe 3.19. São propostas diferentes, porem ambas as argumentações concordam que Jesus desceu ao inferno depois de morrer. Abordamos cada uma delas e verificamos as incoerências. Mas há um problema que todas têm que enfrentar. É que a origem da frase “desceu ao inferno” não aparece em nenhum lugar da Bíblia. Mas de onde exatamente surgiu esta idéia? O Credo Apostólico A primeira ocorrência da expressão “desceu ao inferno” está no Credo Apostólico, que tem a expressão latina “descendit ad inferna” (desceu aos infernos/hades) e a outra se encontra no Credo de Atanásio, com a expressão latina “descendit ad inferos” (desceu às regiões inferiores). O texto final do Credo Apostólico faz uma bela declaração de fé: Creio em Deus, o Pai onipotente, Criador do Céu e da Terra. E em Jesus Cristo, seu único filho, nosso Senhor, o qual foi concebido do Espírito Santo, nascei da Virgem Maria, padeceu sob Poncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado, desceu aos infernos, no terceiro dia ressussitou dos mortos, subiu aos céus, este sentado a destra de Deus, o Pai onipotente, donde há de vir para julgar os vivos e os mortos. Creio no Espírito Santo, na santa igreja católica, na comunhão dos santos, na remissão dos pecados, na ressurreição da carne e na vida eterna. Amém. Sobre o desenvolvimento histórico do Credo Apostólico, Wayne Grudem diz que “foi surpreendente descobrir que a frase desceu ao inferno não se encontrava em nenhuma das versões primitivas do credo até que ela apareceu um uma versão de Rufino em 390 d.C., o único a incluí-la antes de 650 d.C”. Já que não é uma doutrina bíblica, Heber Campos afirma que devemos rejeitar as várias idéias relacionadas como a “decida literal de Jesus ao hades”. Interpretação mais equilibrada Ao rejeitarmos as idéias apresentadas anteriormente, somos forçados automaticamente a sugerir alguma outra interpretação mais coerente, porém com os mesmos critérios de avaliação. Vamos propor, na verdade, duas interpretações diferentes, mas que não são contraditórias entre si, pois entendemos que ambas podem ser usadas como propostas válidas e mais confiáveis biblicamente falando. Interpretação reformada O entendimento dos teólogos reformados com respeito a eventual descida de Jesus ao hades é bem diferente da de muitos cristãos, principalmente dos estudiosos citados neste trabalho. Esta interpretação está na verdade baseada na proposta do reformador de Genebra, João Calvino (1509-1564). Ele sustentou que “a descida ao hades foi a experiência das dores do inferno na alma de Jesus, enquanto seu corpo estava ainda pendurado na cruz, especialmente a experiência da ira divina contra o pecado, que ele suportou no lugar dos seres humanos”. Para Calvino, a alma de Cristo tinha de sentir todos os efeitos do juízo pois se alma dele não tivesse sido afetada pelo castigo, seria somente salvação de corpos. Erwin Lutzer corrobora com esta idéia, principalmente quando se analisa com profundidade o significado do brado de Cristo, enquanto pendurado na cruz em meio às trevas (Meu Deus! Meu Deus! Por que me abandonaste? (Mt 27.46). Ele diz: Jesus certamente suportou o sofrimento do inferno, pois o inferno é escuridão, é desamparo, é ser abandonado por Deus, e se foi assim, o horror do que ele experimentou está além de nossa compreensão. Heber Carlos de Campos, escritor reformado, conclui dizendo que “Jesus nunca desceu ao hades de literal e espacialmente, mas experimentou intensivamente todas as coisas que o hades representa”. Interpretação analógica A explicação da interpretação tipológica não chega a contradizer a interpretação reformada, mas dá ao texto I Pe 3.19-20 um enfoque diferente, todavia ambos concordam que Cristo não desceu ao inferno literalmente. Segundo Wayne Grudem, esta explicação é a mais satisfatória de I Pe 3.19-20 e remonta Agostinho que já dizia: a passagem não se refere a algo que Cristo fez entre sua morte e ressurreição, mas ao que “fez no âmbito espiritual da existência” (ou pelo Espírito) nos dias de Noé. Isto quer dizer que quando Noé estava construindo a arca, Cristo, “em espírito” estava pregando por meio de Noé aos incrédulos hostis em torno dele. Esta concepção, não é tão popular, mas é digna de alta consideração. Não é tão mitologia quanto as anteriores (exceto a interpretação reformada), não se baseia em doutrinas humanas (Credo Apostólico) e tem apoio bíblico considerável. Por exemplo, em I Pe 1.11, ele diz que o “Espírito de Cristo” falava por intermédio dos profetas do Antigo Testamento. Em 2 Pe 2.5, ele chama Noé de “pregador da justiça”, empregando o substantivo keryx que vem da mesma raiz do verbo pregar de I Pe 3.19. Tudo isso nos leva a concluir que Cristo “pregou aos espíritos em prisão” por intermédio de Noé nos dias anteriores ao dilúvio. Esta idéia levanta um problema, pois eruditos em grego, afirmam que a Bíblia nunca usa “espírito” em referencia aos humanos. Como responder a isto? As pessoas a quem Cristo pregou por meio de Noé eram incrédulos sobre a terra na época de Noé, mas Pedro os chama “espírito em prisão” porque estão agora na prisão no inferno (A NASB diz que Cristo pregou “aos espíritos agora em prisão) [...] Assim, Cristo pregou aos espíritos em prisão significa: cristo pregou as pessoas que são agora espírito em prisão, quando ainda eram pessoas sobre a terra. Um outro conjunto de versículos em Pedro apóia está interpretação, de acordo com o contexto maior de I Pe 1.13-22. Neste contexto geral, Pedro parece fazer uma analogia interessante entre a situação de Noé e a situação de seus leitores. O confronto entre estas épocas distintas revela que ambos faziam parte de minoria justa, rodeados por incrédulos hostis, aguardavam o iminente juízo de Deus (I Pe 4.5-7; II Pe 3.10), deviam pregar com ousadia (I Pe 3.14, 16-17; 3.15; 4.11) e eram salvos ou seriam salvos (I Pe 3.13-14; 4.13; 5.10).
Em (Efésios 4:9) Paulo
declara que Jesus desceu "até as regiões inferiores da terra" e o
Credo dos Apóstolos declara que, depois de ter sido morto, Jesus "desceu
ao inferno". Entretanto, quando Cristo estava morrendo, entregou o seu
espírito nas mãos do Pai (Lc 23:46) e disse ao
ladrão que este estaria com ele no "paraíso" (Lc 23:43), ou seja,
no "terceiro céu" (2 Co 12:2, 4). Para onde Jesus foi então: para o
céu ou para o inferno?
Há duas posições a respeito do lugar para onde Jesus foi durante os três dias em que o seu corpo permaneceu no túmulo, antes da ressurreição: uns defendem que ele foi para o Hades; outros, que foi para o céu. Para o Hades. Os partidários dessa posição afirmam que o espírito de Cristo foi ao mundo espiritual, enquanto o seu corpo permanecia no túmulo. Crêem que Jesus "pregou aos espíritos em prisão" (1 Pe 3:19), que estavam num lugar de cativeiro temporário, aguardando a sua chegada para "levar cativo o cativeiro", isto é, levá-los para o céu. De acordo com essa posição, havia dois compartimentos no Hades (ou sheol), uma para os salvos e outra para os perdidos. Eles estavam separados por "um grande abismo" (Lc 16:26), que ninguém podia ultrapassar. A seção dos salvos era chamada de "o seio de Abraão" (Lc 16:23). Quando Cristo, "sendo ele as primícias" da ressurreição (1 C > 15:20), ascendeu, Ele levou esses santos do AT consigo pela primeira vez. Para o Céu. Esse parecer sustenta que as almas dos crentes do AT foram diretamente para o céu no momento de sua morte. Em favor disso tem-se os seguintes argumentos: Primeiro, Jesus afirmou que o seu espírito estava indo diretamente para o céu, quando disse: "Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito" (Lc 23:46). Segundo, Jesus prometeu ao ladrão na cruz: "Hoje estarás comigo no paraíso" (Lc 23:43); mas "paraíso" é definido como sendo "o terceiro céu" em 2 Coríntios 12:2, 4. Terceiro, quando os santos do AT deixaram esta vida, foram diretamente para o céu. Deus tomou a Enoque para si (Gn 5:24; cf. Hb 11:5), e Elias foi tomado "ao céu" quando partiu (2 Rs 2:1)
Quarto, "o seio de
Abraão"(Lc 16:23) é uma descrição do céu. Em nenhum ponto ele é descrito
como sendo o inferno. É o lugar para onde Abraão foi, que é o "reino dos
céus" (Mt 8:11).
Quinto, antes da cruz, quando os
santos do AT apareciam, era do céu que vinham, como aconteceu com Moisés e
Elias no Monte da Transfiguração (Mt 17:3).
Sexto, os santos do AT tiveram de esperar a ressurreição de Cristo para que seus corpos fossem ressuscitados (1 Co 15:20; cf. Mt 27:53), mas suas almas foram diretamente para o céu. Cristo foi o Cordeiro morto "desde a fundação do mundo" (Ap 13:8), e eles para lá foram pelos méritos que Deus sabia que Cristo cumpriria. Sétimo, a expressão "até as regiões inferiores da terra" não é uma referência ao inferno, mas ao túmulo. Até mesmo o ventre de uma mulher é descrito como sendo "profundezas da terra" (SI 139:15). Essa expressão significa simplesmente covas, túmulos, lugares fechados na terra, em oposição a partes altas, como montanhas. Além disso, o inferno não se localiza nas partes mais baixas da terra - mas "debaixo da terra" (Fp 2:10). Oitavo, a frase "desceu ao inferno" não constava do Credo Apostólico primitivo. Ela foi acrescentada somente no século IV a. D. Além disso, um credo como tal não é inspirado, mas apenas uma confissão humana de fé. Nono, os "espíritos em prisão" não eram salvos, mas seres perdidos. Na verdade, essa pode ser uma referência a anjos, não a seres humanos (veja os comentários de 1 Pedro 3:19). Finalmente, quando Cristo "levou cativo o cativeiro", não estava levando amigos para o céu, mas trazendo inimigos a uma prisão. E uma referência à sua vitória sobre as forças do inimigo. Os cristãos não são "cativos" no céu. Não somos forçados a ir para lá contra a nossa própria e livre escolha (veja Mt 23:37; 2 Pe 3:9).
Fonte:
http://pastoradaocarvalho.blogspot.com.br/2009/06/jesus-desceu-ao-inferno.html
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